Maria José Arthur é pesquisadora, feminista e defensora dos direitos humanos das mulheres. Para ela, ser feminista traz consigo imensos desafios, nomeadamente a resistência que há, sobretudo vinda dos homens, que receiam perder os seus direitos. Para a pesquisadora, esta resistência demonstra “(…) claramente medo, não é? É uma reação de defesa. O problema é que muitas das vezes a gente quando está a falar de igualdade de direitos, a igualdade de direitos vai atingir directamente os homens e os privilégios que têm. E são tão grandes que estão a engolir os nossos direitos. Portanto, é verdade que os homens perdem alguma coisa, mas não perdem direito, perdem privilégios. E é aí que toda a desqualificação do feminismo faz sentido. Porque cada vez que a gente fala que quer defender isto, quer igualdade, etc, é feminista. E ao dizer feminista, acabou. (…) Então como é que é ser feminista? É terrível, mas ao mesmo tempo a gente também se ri (risos). Trabalhamos em grupo. (…) Quer dizer, no fundo a gente também vai encontrando momentos para descomprimir e nos rimos também.
Nascida na cidade de Quelimane, capital da província da Zambézia, em 1958, Maria José mudou-se posteriormente para Maputo, de modo a continuar os estudos, tendo feito o bacharelato em História (1980) na UEM. Depois de graduada, deu aulas de História no Departamento de História/Geografia na Faculdade de Educação, como assistente estagiária. Em 1984, regressa à Beira, onde dá aulas de História ao ensino secundário (pré-universitário), trabalhando posteriormente no Ministério da Educação e como Directora do Núcleo e do Departamento de Investigação do Projecto Arquivos do Património Cultural (ARPAC), no Instituto de Investigação Sócio-Cultural, do Ministério da Cultura.
Nunca foi membro ou militou na Organização da Mulher Moçambicana (OMM), mas durante o período em que viveu na Beira, em meados dos anos 80, participou na recolha de informação sobre a situação da mulher em Moçambique, como preparação para a conferência extraordinária da OMM em Maputo. Participou, também, ainda na adolescência, em actividades da Organização da Juventude Moçambicana (OJM), mesmo não sendo membro efectivo.
Em 1986, vai para Paris fazer a licenciatura em Antropologia, na Universidade Paris 8, onde fica até 1988, altura em que regressa e continua a trabalhar na ARPAC, já em Maputo. Entretanto, pede uma licença sem vencimento e trabalha 2 anos como consultora na área de HIV/SIDA para o Ministério da Saúde. Em 1993, entra para os quadros da UEM como docente. Nesse período, regressa a Paris para, na mesma universidade, fazer o mestrado 2 em Antropologia (1998).
O seu interesse por questões de género surgiu na altura em que fez pesquisas sobre o impacto do HIV/SIDA, uma vez que as mulheres são as mais afectadas pela doença. Começou a participar sistematicamente em pesquisas quando colaborou com a WLSA, na época ainda ligada ao CEA/UEM, como por exemplo a pesquisa Famílias em Contexto de Mudança (1997).
Sai da UEM em 2002, após pedir uma licença sem vencimento, para onde não regressou. Foi Coordenadora Nacional da WLSA Moçambique, para onde entrou efectivamente em 2002, e é actualmente coordenadora da área de Comunicação, Lobby e Advocacia. Responde também a solicitações de participação em palestras, aulas, apresentações, entre outros.
Sem dúvida uma das figuras mais importantes na luta pelos direitos humanos das mulheres, Maria José confessa que esta não é uma luta fácil: eu às vezes preferia, sei lá, defender os elefantes, porque as pessoas gostam mais dos elefantes que das mulheres, né? Portanto, é mais fácil defender o elefante, o rinoceronte, não matem, está a extinguir, do que as mulheres. Quer dizer, acho que a situação é claramente desfavorável nesse aspecto.
Para a pesquisadora, ser feminista “É um desafio, mas é muito interessante para mim também. Eu acho que aprendi muito nesta questão. Primeiro, a gente tem que estar muito forte, muito convicta do que pensa, para poder aguentar tanto embate. Mas há também um outro aspecto que eu não referi. É que ser feminista, para mim, é também uma grande solidariedade com todas as pessoas em situação de exclusão. Por isso é que eu acho que não é possível ter uma feminista que não defenda a democracia, outros oprimidos, que não esteja com a Lambda na luta para a sua regularização, etc. Então eu acho que essa experiência de ser mulher e de lidar com a exclusão nos…deveria, sei que há mulheres que não é assim, né? Mas a mim pelo menos levou-me a esta empatia com todas as pessoas que, de facto sofrem e estão em situação semelhante.”
Esta história de vida foi elaborada tendo como base uma série de entrevistas realizadas entre Maio e
Julho de 2017, por Catarina Casimiro Trindade, para a sua pesquisa de doutoramento.
“Género e cidadania: a emergência de um discurso feminino nos sindicatos em Moçambique. O caso dos Comités da Mulher Trabalhadora na Organização dos Trabalhadores de Moçambique (OTM) e no Sindicatos Livres e Independentes (SLIM)”, 1998.