FEMINISMOZ

Laurinda Agostinho Ajuma Albano

Nampula


Chamo-me Laurinda Agostinho Ajuma Albano, tenho 26 anos de idade, sou casada e tenho dois filhos ainda menores. Sou membro da Associação Virane Mohené, em Natiquiri, na cidade de Nampula. Eu tenho a minha machamba e a Associação tem machamba-escola, onde aprendemos as diferente técnicas agrícolas. Eu sou primeira vogal da Mesa da Assembleia da União Distrital de Nampula desde 2019.

A minha história na Associação começa com a minha mãe.  A minha mãe é que era membro da Associação e ela convidou-me a entrar e ter machamba. Nessa altura ainda estava a estudar no ensino secundário. Quando me tornei membro, comecei a participar nas formações que os técnicos de Agricultura davam aos membros. Um dia, o técnico, quando se estava a prepara uma feira agrícola, selecionou-me para ajudar a organizar a feira.  A minha tarefa foi de enviar as cartas de pedido de apoio aos Bancos, Empresas e outras entidades. Conseguimos alguns apoios. Dada a minha participação activa, fui eleita como segunda vogal da Mesa de Assembleia há 4 anos, quando se realizou a Assembleia eleitoral da Constituição da União Distrital do Distrito de Nampula. No ano passado, o primeiro vogal pediu afastamento e eu passei a ser a primeira vogal.

Ao logo deste processo, tive dificuldades em conciliar os estudos e as minhas actividades na Associação, mas fui sempre me esforçando por fazer as duas. Quando fiz a 10ª classe, concorri para uma formação técnica, a primeira vez não passei, no ano seguinte concorri outra vez. Desta vez passei, mas sem vaga. Então decidi continuar a estudar. Fiz a 12ª classe. Concorri para o Instituto de Saúde, fiz exame de admissão e passei, mas sem vaga. Fiquei em casa. A minha mãe meteu os documentos em outra instituição de formação técnica, fiz o exame de admissão, mas o meu nome não apareceu na lista. No ano passado, a minha mãe falou com um colega dela que tem um instituto privado de formação de professores, meti os meus documentos e comecei a estudar, até interromper por causa do COVID-19. Estou na formação de professores primários. Comecei o curso em Março do ano passado. O curso tem a duração de dois anos. Durante este tempo todo, estive sempre a participar nas actividades da Associação.

Um dos grandes ganhos para as mulheres em Moçambique, na minha opinião, é o facto de haver espaço para as mulheres trabalharem. Há muito tempo, era muito difícil uma mulher trabalhar. Há muito tempo a mulher casava muito nova, ficava em casa a cuidar do marido, dos filhos e não podia estudar nem trabalhar. Não significa que agora não podemos cuidar do marido e dos filhos, mas há uma grande diferença: podemos estudar e trabalhar, mesmo estando casadas. Isso é bom para as mulheres, porque nos sentimos livres, podemos fazer o que nós queremos no sentido de trabalhar. Claro que há homens que, ainda hoje, proíbem as suas mulheres de estudar ou trabalhar, isso depende do coração que cada um deles tem, mas acho que está a diminuir. Quando vejo estas mudanças sinto-me feliz e orgulhosa por ser mulher.

Apesar destes ganhos, ainda temos problemas de violência. Muitas crianças e mulheres são violadas sexualmente em Nampula. Quando acontece, muitas vezes, as crianças não são ouvidas, outras vezes as crianças não falam porque é muito difícil para elas. As crianças não são ouvidas, porque muitas vezes quem pratica a violência sexual são parentes próximos, um tio, um primo, etc. Quando a criança denuncia, os adultos não acreditam. Em outros casos, as crianças não denunciam porque o violador ameaça “se falares, vou-te fazer isto ou aquilo”. A criança até pensa em denunciar, mas lembra-se da ameaça e cala-se.

O meu sonho como mulher é trabalhar, ter um emprego para ajudar a minha família e os meus filhos para eles crescerem e estudarem bem. Quero ter o meu dinheiro próprio, construir a minha casa melhorada e apetrechá-la com tudo o que eu gosto.

Em relação à situação do COVID-19, sinto-me triste porque está tudo parado. Contudo, acho que tudo vai mudar, é preciso que rezemos muito para isto acabar e continuarmos a trabalhar. Acho que a violência com esta situação aumentou nas famílias, porque todos estão em casa. Antigamente, o marido ia ao serviço, a mulher ficava em casa com as crianças ou ia trabalhar e quando chegavam a casa estava tudo bem. Mas hoje, pai, mãe e filhos estão todos sempre em casa e tem acontecido muitos problemas. Por exemplo: o marido pode receber uma mensagem estranha de uma colega do serviço que a mulher não vai perceber e isso vai criar discussão e até agressões no casal. Também pode ser que a mulher receba uma mensagem que o marido não vai perceber, mesmo que ela tente explicar, ele não vai querer entender.

Maputo, 23 de Julho de 2020

Entrevista por Joana M. M. Ou-chim (1) .
Fotografias de João Albano Zeca Anibal.


(1) Joana M. M. Ou-chim é consultora na área de género e desenvolvimento em Moçambique.


Women’s Voice and Leadership ALIADAS ( WVL - ALIADAS)
Av. Julius Nyerere, N.º 258 Maputo, Moçambique      CP 4669

(+258) 21 48 75 52 (+258) 21 48 75 65

(+258) 84 51 08 505 (+258) 82 47 08 431

e-mail: info@aliadas.org


www.aliadas.org
EN
PT_MOZ EN